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Última parada 174 - Nós colaboramos!

Desculpem-me aqueles que entendem, gostam e adimiram o cinema e que possuem, efetivamente, gabarito para criticar e falar sobre o assunto, mas hoje, "nois vamo invadir sua praia" por alguns segundos.

Eu já havia assitido, por motivos de força maior, o documentário "ônibus 174" de José Padilha. Isto foi no meio do ano, por volta de junho ou julho, e quando soube do filme em formato comercial achei interessante. Quando vi os trailers, após ter visto o documentário, com cenas reais, tudo pareceu-me muito fidedigno... é muito bem feito. Porém não é para isto que eu estou perdendo 30 minutos do meu sono aqui escrevendo.

O filme conta a história de Sandro (foto), Menino de rua que presencia um massacre contra seus amigos (também meninos de rua) em uma típica ação de "limpeza urbana"*. Este mesmo garoto, que se viu na rua após ter assistido ao assassinato de sua mãe, passa por várias dificuldades desde seu nascimento até fim de sua vida quando decide no dia 20 de janeiro de 2000, às 14h20, sequestrar o ônibus 174.

Baseando-se em relatos daqueles que conviveram com ele, a trama se desenvolve sobre um tom emotivo que nos poupa um pouco da profundidade do tema. Se alguém pretende ver o filme de Bruno barreto, aconselho que antes veja o documentário de José Padilha para perceber a profundidade do filme. Ao ver a história de sandro desde o começo e confrontar estas informações com a análise do sequestro chega-se a uma dúvida cruel: Quem foi o responsável por tudo?

Dizer que a culpa foi de um garoto cheirado de cola e que passou por uma vida turbulenta desde o começo de sua vida é fácil. Mas quem são os responsáveis pelas condições desumanas de milhares de crianças de rua? Será que fazemos, realmente, a nossa parte? Será que acordar todos os dias, trabalhar, pagar impostos e visar nosso crescimento individual sem se preocupar com o que acontece ao nosso redor é certo? Esse é o nosso papel como cidadão?

Ao mesmo tempo, o crime, o caminho errado seria o caminho certo para Sandro? Ele não teve oportunidades ou não quis suas oportunidades? Dizer que a culpa é totalmente da sociedade também é errado! Porém, as soluções para todo este problema vai além de apenas sumir com os meninos de rua. A sociedade vai continuar a produzir meninos de rua se não tomar medidas que cuidem da infância e da juventude, que dê uma educação de qualidade e com condições efetivas de desenvolvimento humano destas crianças. Uma escola que ensine a juntar letras e soletrar, sem contextualizar e realmente formar um cidadão, é uma fábrica de sandros! Uma política baseada na manutenção da miséria para trocar migalhas por votos vai continuar a produzir mais sandros.

Por isso, cada assalto, cada seqüestro, cada desastre social provocado pela miséria humana em que vivemos não é apenas responsabilidade de uma pessoa, não é apenas um zé ninguém que naquele momento aparece como o maior dos vilões, mas a consequência de toda uma estrutura social. A responsabilidade divide e dizima-se sobre todos os setores que compõem o que chamamos de sociedade: sobre nós, que votamos pensando nos nossos interesses e nas políticas que vão nos favorecer ou nos prejudicar sem levar em conta consequências indiretas como a violência que é reflexo de uma segregação social praticada por nós mesmos; sobre o governo que tem na miséria um objeto de troca para conquistar eleitores com migalhas e políticas vazias que não levem o desenvolvimento destas pessoas, sobre estas pessoas.... porque a sociedade não enxerga que quando este tipo de coisa acontece é apenas a última peça a cair de um dominó montado pela falta de compreensão, informação e interesse.

*Limpeza Urbana é quando certo grupos de pessoas (associação de moradores, comerciantes ou o próprio governo) buscam se livrar de moradores de rua, prostitutas e travestis ou qualquer outro tipo de pessoas marginalizada que se instale em determinado local. Este tipo de ação é feita principalmente através do extermínio.